A Derradeira Felicidade

Esta obra de Tito Soledad, que nos remete para o dia-a-dia de um "pueblo" próximo de Talavera, é uma sincera homenagem à vida simples, longe do cosmopolitismo, e às raizes provincianas que por vezes são as únicas coisas que nos recordam de onde viemos e para onde iremos.
Um livro bonito, desprentencioso, fruto do acaso na minha velhinha mas simpática livraria da rua da pensão do gato preto, na cidade do Lis.
O que 2,5€ me possibilitaram num recatado serão...

Ondjaki "E se amanhã o medo"

Ondjaki nasceu 1977 em Luanda, e é licenciado em sociologia. O seu primeiro livro de poesia Actu Sanguíneo foi publicado em 2000. No mesmo ano saiu o romance Bom dia, Camaradas, pela editora angolana Chá de Caxinde. Em 2001 publicou o livro de contos Momentos de Aqui, e em 2002, além da poesia de Há Prendisajens com o Xão (Editorial Caminho), o romance O Assobiador. Em 2003 oseu romance de estréia foi reeditato em Portugal. Em 2004 publicou um novo romance: Quantas Madrugadas tem a Noite (Editorial Caminho) e o livro de contos E se amanhã o medo (INALD). Com ainda menos de 30 anos de idade, Ondjaki é hoje um dos nomes mais destacados da literatura angolana.

Este foi um bom presente que esta época nos trouxe. Um bom exemplo de literatura em português que é uma verdadeira lufada de ar fresco.

quinta-feira, dezembro 25, 2008

Falsas sombras no cantinho


Falsas sombras dos cântaros no cantinho

Às vezes as nossas sombras são tão falsas como nós próprios.


Falsas sombras de los cántaros en la esquina

A veces nuestras sombras son tan falsas como nosotros mismos.

quarta-feira, dezembro 24, 2008

Sem tetas não há Natal


Estes dias antes do Natal são uma azáfama de carros, sacos de plástico, papéis e de gente que não tem dinheiro e mesmo assim teima em gastá-lo. Os centros comerciais estão à pinha, são os novos fóruns de cidadania, baseados no imediatismo, nos quais os mais acérrimos críticos tendem a ir, com a hipócrita desculpa que é onde se podem comprar livros, discos, filmes e outras coisas para o colesterol do seu intelecto. Eu sou um deles.

É verdade, isto do colesterol intelectual. Há coisas que enfiamos para dentro da nossa cabeça, que teimamos em assimilar, que não passam de gorduras saturadas, à boa maneira das morcelas de Leiria, ou de Burgos, que enfiamos para dentro do bucho, lambendo os dedos e, no dia seguinte, colhendo os frutos num local redondo que parece uma anilha em chamas. Coisas que nos dão um imenso prazer, mas que, no fundo, não servem para nada e não sei como é que o nosso organismo as assimila ou expele. O hedonismo, em suma. Algumas nem dão assim tanto prazer, mas, para bem parecer, também para cá as metemos. Já fiz isso com Tarkovski, e tal como a sua obra, foi um “sacrifício”.

Mas, apesar de ser um adepto dos temas gastronómicos, não é isto que me fez teclar por esta época do ano que, segundo o telejornal da TVI, é propícia à depressão.

Ontem, lá estava, como centenas como eu, num shopping a ultimar os últimos “regalos” natalícios. Muitos de vocês sabem o que são estas compras em que temos que tentar adivinhar o que poderá ser do agrado do outro ou ter alguma utilidade e, devo dizer, que é uma tarefa que roça o penar.

Já estava farto, à minha maneira, de andar daqui para ali e ver como estava rodeado de coisas que pouco ou nada melhoram a minha vida e que a sociedade faz com que pensemos que estas ainda hão-de ser prioridades. A elas estará intimamente unida a nossa busca de felicidade, é verdade. Sei que a minha prima não será a mesma se não atingir o seu ideal, a Britney. Se é que o consumismo traz felicidade, ao menos que seja momentânea como é seu apanágio… e que nos traga sexo! A sério, no futuro, ou se calhar já agora, os centros comerciais, a par das massagens tailandesas, dos spas e sei lá o quê, certamente terão novos bordeis e casas de prazer. Será isto uma imagem de uma sociedade degradada? Ou sou eu a anunciar o apocalipse em lingerie? As quatro cavaleiras negras do apocalipse, no dia da besta, a cavalgarem a besta que há em nós… Dirão alguns, “Heaven, I’m in Heaven, and my heart beats so that I can’t…”

As coisas que nos passam pela cabeça, quando já estamos fartos de estar num local em que o único movimento está associado ao vaivém de sacos de marcas registadas.

E onde estão as feministas? Onde estão? Certamente estão a discutir o porquê da utilização genérica do termo “homem” como sinónimo de humanidade, que as bilhas de gás não têm sexo e podem ser carregadas por quem seja, e todas essas questões que têm mais a ver com questões de géneros gramaticais e pouco com a verdadeira igualdade entre mulheres e homens. Onde estão essas senhoras e senhores? Onde estão? De certeza que não vão aos shoppings, ou são desses como eu que lá vão, gostam, e no entanto só sabem é criticar e armar-se em intelectualoides. De certeza que não vão, porque se fossem aperceber-se-iam que este comércio, ávido, hedonista, ilusório, tem faixa etária e principalmente copa B de “underbra”. Por essas bandas, não se vê o Sr. António alfaiate e a D. Joaquina modista, nem o Sr. Adelino e a D. Beatriz que venderam a retalho toda a vida com o lema de “servir bem e bem servir”. Mas como o cliente tem sempre razão, o melhor é mesmo optar pelas Britneys do salário mínimo, bem munidas de talha de sutiã, que nos deleitam o olhar e que, graças às suas tetas, podem comprar os seus presentes de escaparate.

Longe dos centros comerciais, apesar de saber tudo sobre tecidos, marcas e como bem atender, vejo o Sr. Ernesto, que tantas calças e cuecas vendeu, sentado à espera da sua vez no centro de emprego, onde uma técnica, a recibo verde, à qual não consigo avaliar a copa, apesar do decote, lhe diz: “Apesar da sua experiência, Sr. Ernesto, não me parece que o senhor se adeqúe à candidatura desta loja de roupa especializada em pijamas”.

O Sr. Ernesto, resignado nos seus quarentas e picos, inspira fundo e pensa: “no próximo Natal vou pedir ao Pai Natal uns implantes”, tudo isto vislumbrando um horizonte arredondado, voluptuoso e de copa desconhecida.


sábado, dezembro 20, 2008

O "desEMPREGO" do Super-Homem


O autor de bd, Zé Manel, prendou-nos com esta prancha sobre o novo dia-a-dia do Super-homem. Agora até ele anda a recibos verdes! Podem encontrar mais pranchas interessantes no blog "Divulgando BD" do amigo Geraldes Lino.

"Foda-se", por autor desconhecido


Este texto vem a propósito de como o recurso ao "palavrão" pode ser, para além de rude e pouco próprio, verdadeiramente hilariante. Tenho este texto guardado há mais de cinco anos e, para dizer a verdade, não estou seguro que seja da autoria deste autor. Se alguém souber, agradecia que mo dissesse. No entando o autor é brasileiro e o texto está engraçado "comó caralho" escrito em português do Brasil!

O nível de stress de uma pessoa é inversamente proporcional à quantidade de "foda-se!" que ela diz. Existe algo mais libertário do que o conceito do "foda-se!"?
O "foda-se!" aumenta a minha auto-estima, torna-me uma pessoa melhor. Reorganiza as coisas. Liberta-me. "Não quer sair comigo?! Então, foda-se!"."Vai querer mesmo decidir essa merda sozinho(a)?! Então, foda-se!".
O direito ao "foda-se!" deveria estar assegurado na Constituição. Os palavrões não nasceram por acaso. São recursos extremamente válidos e criativos para dotar o nosso vocabulário de expressões que traduzem com a maior fidelidade os nossos mais fortes e genuínos sentimentos. É o povo a fazer a sua língua. Como o Latim Vulgar, será esse Português Vulgar que vingará plenamente um dia.
"Comó caralho", por exemplo. Que expressão traduz melhor a ideia de muita quantidade que "comó caralho"? "Comó caralho" tende para o infinito, é quase uma expressão matemática. A Via Láctea tem estrelas comó caralho, o Sol é quente comó caralho, o universo é antigo comó caralho, eu gosto de cerveja comó caralho, entendes?
No género do "comó caralho", mas, no caso, expressando a mais absoluta negação, está o famoso "nem que te fodas!". Nem o "Não, não e não!" e tampouco o nada eficaz e já sem nenhuma credibilidade "Não, nem pensar!" o substituem. O "nem que te fodas!" é irretorquível e liquida o assunto. Liberta-te, com a consciência tranquila, para outras actividades de maior interesse na tua vida.
Aquele filho pintelho de 17 anos atormenta-te pedindo o carro para ir surfar na praia? Não percas tempo nem paciência. Solta logo um definitivo "Jorginho, presta atenção, filho querido, nem que te fodas!". O impertinente aprende logo a lição e vai para o Centro Comercial encontrar-se com os amigos, sem qualquer problema, e tu fechas os olhos e voltas a curtir o CD (...)
Há outros palavrões igualmente clássicos. Pense na sonoridade de um "Puta que pariu!", ou seu correlativo "Pu-ta-que-o-pa-riu!", falado assim,cadenciadamente, sílaba por sílaba. Diante de uma notícia irritante, qualquer "puta-que-o-pariu!", dito assim, põe-te outra vez nos eixos.
Os teus neurónios têm o devido tempo e clima para se reorganizarem e encontrarem a atitude que te permitirá dar um merecido troco ou livrares-te de maiores dores de cabeça.
E o que dizer do nosso famoso "vai levar no cu!"? E a sua maravilhosa e reforçadora derivação "vai levar no olho do cu!"? Já imaginaste o bem que alguém faz a si próprio e aos seus quando, passado o limite do suportável, se dirige ao canalha de seu interlocutor e solta: "Chega! Vai levar no olho do teu cu!"? Pronto, tu retomaste as rédeas da tua vida, a tua auto-estima. Desabotoas a camisa e sais à rua, vento batendo na face, olhar firme, cabeça erguida, um delicioso sorriso de vitória e renovado amor-íntimo nos lábios.
E seria tremendamente injusto não registar aqui a expressão de maior poder de definição do Português Vulgar: "Fodeu-se!". E a sua derivação, mais avassaladora ainda: "Já se fodeu!".
Conheces definição mais exacta, pungente e arrasadora para uma situação que atingiu o grau máximo imaginável de ameaçadora complicação? Expressão, inclusivé, que uma vez proferida insere o seu autor num providencial contexto interior de alerta e auto-defesa. Algo assim como quando estás a conduzir bêbedo, sem documentos do carro, sem carta de condução e ouves uma sirene de polícia atrás de ti a mandar-te parar. O que dizes? "Já me fodi!"
Liberdade, igualdade, fraternidade e foda-se!

Autor Desconhecido

Crónica de un tren lleno de mierda y de memorias


Lobo Antunes en una de sus crónicas escribió que sólo nos volvemos hombres cuándo nuestro padre muere. Quizás fue uno de los textos que más me hizo reflexionar sobre mi existencia y mi lugar en el mundo, algo que, muchas veces, prefiero no hacer.

No tuve un padre ausente, a pesar de los largos kilómetros que muchas veces nos separaban, para que pudiera darme que comer y proporcionarme una educación, dicha superior por haber sido en una universidad (pero no creo que así sea), que él, por inherencia de las circunstancias de su vida, rechazó, haciendo carrera en la vida. Él siempre ha estado presente con el ejemplo, con sus evidentes peculiaridades que hacen con que, con todas sus imperfecciones y virtudes, sea mi padre.

Mi padre no murió, pero en el día en que se prejubiló parte de su existencia, de mi existencia, ha muerto, pero sigue aquí con nosotros, como un buen fantasma, que con su espíritu nos recuerda quién somos.

Tenemos el ferrocarril pulsando en nuestras venas. Por los vistos, y por lo que oigo a gente de mi familia, esta ascendencia viene ya desde hace mucho, quizás de mi tatarabuelo que con sus manos, y con las laboriosas manos de otros obreros, su sudor, surcó el Alentejo con las líneas del progreso del siglo XIX, las líneas del tren que viajará, con paradas constantes, a veces de emergencia, por tres o cuatro generaciones.

Mi bisabuelo paterno, de quien nada más sé, era trabajador del ferrocarril. Sus siete hijos, entre ellos mi abuelo, fueran asalariados de esta institución, si es que le puedo llamar institución, que recorrió el siglo XX luso con carriles y tornillos de recambio. Desde el fascismo, aséptico y hambriento para el pueblo, pero lujoso y ostentoso para quién estaba en un escalón más alto en una estructura que recuerda el medieval feudalismo.

En esa época, incluso la mierda tenía que tener permiso para salir de dentro de un vagón. Era mi padre niño y acompañaba el suyo en una labor que se hacía frecuentemente entonces, limpiar la mierda de los caballos y de los demás animales que viajaban en los trenes. La mierda es mierda y no se puede disertar sobre el destino de la misma, a no ser que se sea un mierdas como el responsable da la estación que, utilizando el “escalón” que el régimen le permitía, y que mencioné antes, humilló mi abuelo no permitiendo trasladar los inútiles excrementos a su pequeña huerta, dónde podría matar un poco de la hambruna impuesta por el régimen a quién agradecía tener mierda para limpiar, diciendo que era propiedad de la CP, es decir, del ferrocarril luso.

La mierda se quedó inútil, como es la mierda cuando no sirve para intentar crear, sembrando algo en su malogrado origen, en el local en que, cabezonamente, el jefe la acumulaba, no sé cual el sitio, pero deduzco que un buen sitio sería su boca. Se quedó así hasta la revolución, en que incluso el jefe que no compartía la mierda con los demás seguramente había sido comunista de toda la vida.

En esta época, después de tres años, sin sentido, en una colonial guerra, y, ya que utilizo mucho el taco, una mierda de país por delante, sin perspectivas de trabajo y de poder mantener su familia, mi padre no pudo huir a las líneas de hierro de su genético destino. Ingresó en la CP. Ya no era la misma que de los tiempos de su padre, las cosas habían cambiado, aunque solamente fuera de apariencia, el antiguo régimen era una cosa del pasado y el futuro estaba en la nueva democracia de los partidos, de sus diputados elegidos libremente por todos. ¡Yupi! ¡Viva la democracia! ¡Poder para el pueblo! ¡El pueblo unido jamás será vencido! Y todo lo que podáis imaginar y que probablemente ya habéis visto en algún episodio de “Cuéntame”.

Gracias a la democracia yo siempre he tenido un regalito de navidad (ya que los reyes no pasan por Portugal, ahí somos más “british” y expulsamos al niño Jesús del portal de belén, durante algún tiempo, para que nos trajera los regalos de Noche Buena, hasta que Coca-cola dijo que llega de niños, hay que tener cuidado con la pedofilia, y nos mandó un gordo viejo, obesamente vestido de rojo, para que compremos la bebida que antes era un jarabe para la cagalera y que a mí me hace tirar pedos como si estuviera en Irak y sin que Bush sepa) por parte del sindicato de maquinistas. Recuerdo muy bien el payaso “Batatinha” (¡mamá como lo quería!) y un robot que destornillé para sacar el motor. La culpa fue de mi progenitor porque me regaló mi primer destornillador. Fue como si fuera ahora el bolígrafo, me permitía destornillar la realidad y olvidarme de unas cuantas piezas… y cuantos juguetes funcionaran con menos piezas, algunos incluso mejor que antes.

Yo crecí mientras mi padre se dedicaba a sus trenes, a su conducción, y, si hay algo de que me onorgullece, es de haber conducido, sobre las piernas de mi padre, el tren, no solamente un trozo de línea, acelerando y pitando la bocina pero el tren de mi vida. Por supuesto que es un recuerdo infantil, como el olor de la ropa de mi padre, después de un día de trabajo, en que el gasoil era más fuerte que la colonia. ¿Pero quién dice que el olor del trabajo honrado no es digno del más caro perfume?

Fueran tantos los años, tantas cosas debo yo al ferrocarril que, en el fondo, sigo siendo un maquinista, un funcionario de la CP, como fue mi padre, mi abuelo, bisabuelo y tatarabuelo, esperando que el tren llegue al destino sin tardar mucho en la hora prevista, y, si posible, coger la mierda para poder sembrar mejor el futuro.