À
Elsa…
Chove ao ritmo de um makiwara em Naha
O primeiro
pequeno passo para reconhecer o tempo que passou é aceitar que da dor se chega
ao tutano das coisas.
Dojo vazio,
pescoço suado de prática, calças gastas, amarelas em branco de linho, atadas
por nós perfeitos, justos, de dedos duros e calejados, sentados no degrau do
jardim. O som da chuva reaviva o chá que se bebe bem quente.
Chojun
Miyagy não necessitava recordatórios dessa natureza. Fitou o espaço exterior,
ordenado e calado, da sua escola. Aparelhos rudes, toscos de manejo, ajudam a
educar o corpo e o espírito pela pedra.
No seu
olhar ecoavam pancadas secas em madeira inchada. As suas mãos vazias calejavam
uma alma sóbria, recta, generosa de raízes, convictamente fortes e firmes no
agarre.
O último
sorvo de chá, infusão de que toda a arte perece, mereceu-lhe a dignidade de
ritual. Pousada a chávena no degrau de madeira, arranhou os dedos na parte
detrás do pescoço, ainda humedecido, e cumpriu o eco do seu olhar, golpeando
com secura o makiwara molhado à chuva.
A percussão
de uma orquestra de punho, dirigida por este velho maestro de Okinawa, em
crescendo, acompanhada pelo silêncio recatado de sua esposa. Passos curtos,
arrastada marcha de cerimónia, kimono humilde com vincos nobres de princesa,
trouxeram a compreensão do guarda-chuva sujeito nas outras mãos, suaves, da
esposa dum velho mestre.
Chove ao
ritmo de um makiwara em Naha.
O Budo não se
sintetiza na mestria de punhos, esgotada nas artroses do tempo. Também reside
cúmplice nas mãos de quem os protege de treinar à chuva.
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