Enquanto
escrevo neste blog, milhares de pessoas, refugiados deste presente,
percorrem ou arriscam as suas vidas a tentar entrar na Europa. Na
bagagem trazem apenas a esperança de vida. Nem melhor, nem pior.
Apenas de viver.
Perderam
quase tudo na origem, mas mantêm a fé que o destino lhe trará a
paz europeia.
Antes e durante
a 2ª Guerra Mundial, a Alemanha Nacional Socialista, com a ajuda de
uns países coniventes com Hitler, provocou uma maré idêntica de
refugiados. Hoje, com Merkel, assume-se como a paladina da ajuda
humanitária que, paradoxalmente, asfixia a economia das periferias
da união que teima em encabeçar. Talvez seja um ato de contrição,
empatia responsável, uma manobra política de exemplo ou hipocrisia,
pragmática, numérica (recordo-me sempre da contabilidade e registos
exemplares da logística dos campos de concentração), para resolver
alguns problemas da demografia alemã. Não sei. Cada vez se sabe
menos de nos informarmos tanto, de pensarmos que sabemos tanto.
Refugio-me
nas palavras a diário para lidar com esta minha falta de sabedoria.
Vejo-me
de mochila às costas, a lidar com as máfias do tráfico humano, a
tentar ser marido da que a meu lado dorme, pai do que tem quatro
meses no berço e do que tem quatro anos no seu quarto. Vejo-me ainda
filho, irmão, amigo.
Onde
vivo não caem bombas. Não há fome extrema tão visível. Há
desemprego de dois dígitos, mas as famílias em desespero emigram,
não se exilam, nem se refugiam. E a religião, algo promiscua com o
estado (há que dizê-lo), quando comparada com o Estado Islâmico é
laica.
Estas
linhas são como um acampamento improvisado à beira duma estrada.
Se, de repente, chega uma possível boleia em direcção à
alternativa ao risco de vida, ficam os despojos não essenciais para
trás. Estão repletas de cobertores, mantas, tendas, roupas,
carrinhos de bebé, brinquedos de peso supérfluo para onde se pensa
que se vai. Cabe-me, dentro de algum tempo, voltar a estas frases
dispersas à beira do caminho que vou trilhando, a estes despojos do
que os meus olhos grafam na minha memória. Cabe-me nunca esquecer o
refugiado porque também eu me refugio em tanta coisa, principalmente
hoje quando olho para o calendário e vejo que está para chegar a
dureza do inverno.
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