segunda-feira, novembro 13, 2017

Évora, 13/XI/2017

Viemos numa visita relâmpago ao médico, fazer um exame na clínica CDI. Acompanho a Elsa na esperança que a rotina continue rotina nos resultados destas provas médicas. Também venho adoentado, dores de cabeça e digestão malfeita. Acumulo um não sei quê de cansaço, fácil de identificar por ser tão difícil de explicar ao meu corpo e a mim mesmo. Não é normal vir a pedalar para casa como se me viesse a arrastar, mesmo que, na cadeirinha de trás, o ocupante cresça a olhos vistos.
Mas aqui estamos, na mesma sala onde, há um ano, conheci a senhora Mona Lisa, bem acompanhada pelo marido, o qual, como eu, se preocupava com a saúde da sua cara-metade.
Hoje a sala é menos interessante. A televisão está no canal 1 e entrevista um escritor conhecido, apelativo em paleio, estilo e letras. Mostra a sua obra, as suas viagens. Fá-lo muito bem, como poucos. A mim já não me convence e, também, há coisa de um ano, deixei de lê-lo com o entusiasmo de antes. Talvez porque, para além de escrevermos bem, devamos viver mais além do curso das letras e manter uma certa coerência no que somos, mesmo que isso implique viver para escrever a metro. 
Do outro lado da sala de espera está o Zé, parece-me que é Mendes de apelido. Mal nos conhecemos e não o via há anos. Estava a falar alto ao telefone e ouvio-o mencionar uma ressonância. Espero que esteja bem, que o resultado seja inofensivo à sua saúde como a ressonância do passado que a sua presença me causou.
Os ecos levaram-me à juventude da boémia à noite. Dos copos bebidos e das amizades duradouras como o álcool destilado pelo corpo ao longo dum dia de ressaca. O Zé era um gajo tido em conta pela malta que me rodeava, os meus amigos de infância dos quais eu me afastava e me entristecia ver estancados na noite, no fundo duma garrafa.
As amizades da noite, da fixe folia de festival de Verão, de concerto de Queima das Fitas, da noite de fim-de-semana, são fortes para alguns, isso é inegável, porém para mim sempre me pareceram como um shot. Um trago que bate forte e rápido mas impossível de se saborear como um bom vinho.
Será que o Zé, com a sua irreverência noctívaga, ainda ressoa no íntimo da malta? Não sei e espero que sim e que tenha encontrado moderação nos consumos. Espero-o mesmo, com uma tristeza mais madura do que então. Faço questão de tentar manter contacto com muita dessa malta que a noite e o brilho do cristal dos copos encandeou numa idade crítica. O Zé provavelmente seguiu a sua vida, conserva um fígado saudoso e esponja só o Sponge Bob dos seus putos.  Aparenta cuidar-se bem e mantém o estilo de «beto» que o caracterizava. Mas ele não é meu amigo, nem nos cumprimentámos, logo não me preocupa. Preocupam-me outros. Meus. E não vivem longe da costa dum mar numa garrafa de whisky.

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