segunda-feira, maio 15, 2017

Salvador

O meu irmão José Antonio recorda-me sempre as palavras de Juarroz cuja ideia de lembrar-se de alguém se assemelha a uma salvação. Os finados que não conhecem a eternidade são aqueles esquecidos pela memória, penso, e cada dia interiorizo mais as suas palavras e as sinto como as orações que me foram ensinadas na fé da infância. 
Lembramo-nos constantemente um do outro e somos, em grande parte, a salvação um do outro e isso é algo que mostramos com orgulho. A verdadeira amizade equilibra-se entre felicidade e tristeza. Alegramo-nos e entristecemo-nos com os sucessos e fracassos, com a saúde e a doença, com os caminhos em frente e com os sinuosos, mas também com as pequenas coisas que nos simbolizam. O Atleti, o Benfica, a filosofia, a poesia, Espanha e Portugal escatológicos e devoções a santos como o Torrente. Ontem foi com o Salvador, com um festival que não vejo, me passa ao lado, mas que, com um jovem cantor, comprometido com a sua arte, nos salvou a todos por breves momentos, até que cheguem as piranhas em busca de sangue fresco e imediato. 
O José soube da vitória festivaleira histórica antes de mim e sentiu-a por ter sido na língua do seu irmão, também sua, porque a escolheu para a sua família. O Salvador, que o cristianismo promoveu desde a nosso berço, apresenta-se de várias formas. Eu, míope e com estigmatismo, ouvi esta música, em partilhas massificada pelas circunstâncias, com o coração e vi uma aura de beleza, de necessidade de voltar a viver "devagarinho". Não conhecia este Salvador, tinha ouvido falar dele na rádio, e, tal qual como o outro, mesmo que não me consiga salvar para a eternidade, é verdade o que transmite. Que se massifique a sua individualidade, ele pode fazê-lo por nós os dois. O José e eu. É em português por casualidade, mas a salvação não conhece línguas.

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