Apeteceu-me partilhar um parágrafo que achei bem contextualizado para a actualidade. Senão vejamos...
"Fez António Mau Tempo uma pausa, bebe um gole curto de vinho, para falar melhor, limpa a boca às costas da mão, não há guardanapo mais natural, e torna a dizer, Acham eles que passando nós fome nas nossas terras nos devíamos sujeitar a tudo, mas aí é que se enganam, que a nossa fome é uma fome limpa, e os cardos que temos de ripar, ripam-nos as nossas mãos, que mesmo quando estão sujas, limpas são, não há mãos mais limpas do que as nossas, é a primeira coisa que aprendemos quando entramos no quartel, não faz parte da instrução da arma, mas adivinha-se, e um homem pode escolher entre a fome inteira e a vergonha de comer o que nos dão, quando também é certo que a mim me vieram chamar a Monte Lavre para servir a pátria, dizem eles, mas servir a pátria não sei o que seja, se a pátria é minha mãe e é meu pai, dizem também, de meus verdadeiros pais sei eu, e todos sabem dos seus, que tiraram à boca para não faltar à nossa, e então a pátria deverá tirar à sua própria boca para não faltar à minha, e se eu tiver de comer cardos, coma-os a pátria comigo, ou então uns são filhos da pátria e os outros filhos da puta."
In, SARAMAGO, JOSÉ "Levantado do Chão" da editorial CAMINHO pág. 225 da 14ª edição.
1 comentário:
Tendes razão, caro amigo! Esta partilha, apesar de eu não gostar do estilo de Saramago, é deveras actual... e para quem conheçe as gentes do "Levantado do Chão", é algo que não lhes fica indiferente! Obrigado por este momento...
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