Levanto-me da semana. Descalço
em junho frio e com os óculos por pôr na cara levada pela almofada. De um lado
o sono de uma esposa que repousa e é melhor não acordar para uma rotina cansada
da espertina madrugadora. Pode ter uma consequência mal-humorada. Do outro,
ainda silencioso, o dormir a brincar do meu filho sem léxico de colégio. O silêncio
da casa é impossível pelos acervos de brinquedos e pelos livros soltos
patrulhados por gatas que lambem patas. Levanto-me para o papel. A noite deu-me
sonho e a madrugada pôs-me uma nota no bolso. Tenho de a ler antes que vá à
máquina de lavar, como tantas outras notas, bilhetinhos discretos, que a vida me
dá e apenas se estilhaçam na algibeira. Saboreio o hálito do hábito das manhãs
sentado na mesa onde escrevo. No entorno do computador tenho um torno. Vermelho.
Enroscado na madeira. Aqui aperto palavras. Ligeiramente aperto para a direita.
Alivio algo, caso sinta queixa do que se aperta. As palavras também se serram,
se limam, se fresam. E continuam iguais. Palavras. Tal como a madeira ou o
metal. Sinto-me um artesão sempre que uso as minhas mãos. Sou feliz ao
pensar-me assim. Do outro lado ouço lençóis que falam com um fungar no nariz.
Oiço uma chupeta que me chama papá. Desaperto o torno e solto a manhã.
Vou fazer café.
7/VI/2014
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