quinta-feira, setembro 17, 2009

O Meu Pé de Laranja Lima

A vida pode mudar num segundo. Creio que ninguém tem dúvidas desse facto mais que empírico. É verdade, com a experiência vamo-nos dando conta que como vias o mundo num passado (quem sabe até recente) estava efectivamente condicionado por tudo o que te havia formado como pessoa, mas com os anos vamos acrescentando uns ladrilhos…

Foi o que me aconteceu. Mais um livro que me marcou nos últimos tempos, apesar de já o conhecer e ter desprezado categoricamente. Trata-se de “O Meu Pé de Laranja Lima”. Acredito que há livros que esperam que tu os encontres, e foi o que aconteceu com este, quando a sua lomba fina alaranjada me chamou de um amontoado de uma estante de segundo plano numa livraria de magotes.

Quando era puto, a Rede Globo fez uma adaptação para uma telenovela, lembro-me muito mal, mas consigo recordar o cabelo loiro esguedelhado de Zezé e da sua árvore falante que na minha infantilidade via como ridícula. Não tinha como entender isso, não tinha tempo para que os meus seis ou sete anos me ensinassem que tinha que deixar de ser criança para poder entender que essa personagem era como muitos meninos por esse mundo fora que, de um dia para o outro, num instante infantil, vêem a sua vida tornar-se forçosamente adulta…

Aqui temos uma obra digna da nossa humanidade, digo isto no sentido de sermos humanos, com todos os defeitos e virtudes que isso acarreta, mas que nos confere um estatutos que, saibamos, mais nenhuma espécie tem. Talvez por isso me tenha identificado tanto com o autor, um homem inquieto e consciente das suas imperfeições, mas, o mais importante, com a capacidade de transmitir que, apesar da vida ser tão puta (é verdade, não é?), às vezes, ainda podemos desfrutar um pouco da sua condição de meretriz e ser feliz com o que se vai tendo…

Isto não é uma ausência, nem uma negação, da ambição, é o reflexo autêntico de muitos para com esses segundos derradeiros que fazem com que os nossos sonhos de infância tenham que ser bem guardados no sótão do passado… Interessante é ver que mesmo quando a meretriz da vida nos sodomiza, ainda há alguém que consegue descer as escadarias, limpar as teias, o pó, e encontrar na sua infância as respostas para um presente.

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