quinta-feira, novembro 29, 2018

“Mi alma y mi perro”/“A minha alma e o meu cão” – Fernando Aramburu (in “Autorretrato sin mí”, pp. 121 e 122)

“Mi alma y mi perro” – Fernando Aramburu 

En este armario guardo mi alma. Entre camisas y pantalones cuelga, limpia y planchada, de su percha. Por tratarse de una prenda valiosa la llevo conmigo solamente en ocasiones especiales. Un alma es para toda la vida. Un alma no se arregla. Si se rompe no hay otra.

Por eso la reservo para cuando voy a sitios adonde no se debe de ir sin alma. Cuando voy al poema, por ejemplo. Cuando acerco el olfato a una flor aromática o cuando, al alzar la copa de buen vino, dirijo unos instantes a los colores de la tarde.

De niño, en cambio, no iba sin mi alma a ningún sitio. Ni para dormir me la quitaba. La echaba a volar junto a los ángeles que surcaban en bandada el cielo de mi infancia. Me complacía columpiarme con ella en las campanas. Y, al caer la noche, se la enseñaba a Dios, que de tanto conversar conmigo me parecía un miembro más de mi familia.   

El caso es que ya no salgo casi nunca con el alma a la calle. Se me hace que la gente, al verme, lo va a saber todo de mí. O que el viento y la lluvia me podrían arruinar. Los ángeles, mientras tanto, emigraron lejos, a otras infancias, y Dios murió como mueren todos los abuelos entre dos crepúsculos.

Eso sí, cuando me pongo el alma gano en dimensiones. Me revisto de una atmósfera que me hace más brillante que mi perro. Soy de pronto transparente. Soy un depósito de resplandores. Soy espiritual. Ataviado con mi alma, me prolongo en altura; alcanzo mayor profundidad y me dilato, en fin, en todas direcciones hasta dejar atrás la última estrella transitoria.

Pero luego, al borde de la eternidad, me cruzo con la mirada de mi perro, sentado y melancólico cerca de la puerta con su alma peluda de perro, y no sé qué me da dejarlo allí solo, abandonado a horas polvorientas, sin nadie que le hable ni le ponga la comida. Vuelvo entonces sobre mis pasos y hasta la saliva me sabe a amistad. Restituida la percha del armario a la ingrávida envoltura, me visto mis humildes y carnales pingos de diario, acaricio al perro, lo saco a pasear.  

“A minha alma e o meu cão” – Fernando Aramburu 

Neste armário guardo a minha alma. Entre camisas e calças está pendurada, limpa e passada a ferro, no seu cabide. Por tratar-se de uma peça valiosa apenas a uso em ocasiões especiais. Uma alma é para toda a vida. Uma alma não se arranja. Se se rasga não há outra.

Por isso reservo-a para quando vou a sítios onde não se deve ir sem alma. Quando vou ao poema, por exemplo. Quando aproximo o olfato a uma flor aromática ou quando, ao alçar o copo de bom vinho, dirijo uns instantes às cores da tarde.

Em criança, ao contrário, não ia sem a minha alma a nenhum sítio. Nem para dormir a tirava. Lançava-a a voar junto aos anjos que sulcavam em bandada o céu da minha infância. Agradava-me balançar-me com ela nas campanas. E, ao cair a noite, mostrava-a a Deus, que de tanto conversar comigo me parecia um membro mais da minha família.   

A realidade é que já não saio quase nunca com a alma à rua. Parece-me que a gente, ao ver-me, saberá tudo sobre mim. Ou que o vento ou a chuva ma poderiam arruinar. Os anjos, entretanto, emigraram para longe, para outras infâncias, e Deus morreu como morrem todos os avós entre dois crepúsculos.

Isso sim, quando ponho a alma ganho em dimensões. Revisto-me de una atmosfera que me faz mais brilhante do que o meu cão. Sou de imediato transparente. Sou um depósito de resplandores. Sou espiritual. Ataviado com a minha alma, prolongo-me em altura; alcanço maior profundidade e dilato-me, enfim, em todas as direções até deixar atrás a última estrela transitória.

Porém, logo que, à beira da eternidade, me cruzo com o olhar do meu cão, sentado e melancólico próximo da porta com a sua alma peluda de cão, e não sei porquê me dá para deixá-lo ali sozinho, abandonado a horas poeirentas, sem ninguém para falar-lhe ou pôr-lhe a comida. Volto então sobre os meus passos e até a saliva me sabe a amizade. Restituído o cabide do armário à envoltura sem peso, visto os meus humildes e carnais trapos do dia-a-dia, acaricio o cão, levo-o a passear. 

(in “Autorretrato sin mí”, pp. 121 y 122) 
Autor desconhecido

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