O caminho do guerreiro (Bushido do século XXI)
Existe uma tendência que se
concretiza no vazio porque com o corpo se nasce e se morre. Vazio de adornos
que não fiquem gravados na epiderme ou grafados na intemporalidade do ser.
As artes marciais são um
adorno intangível, imaginado em estética, porque não adornam o corpo, endurecem-no
e realizam-se na ética dum espírito que entende dualidades, tanto vive tempos
de guerra como de paz.
Em silêncio, sem grandes
alaridos, colocam-te ao espelho limitações, desafios reais dum segundo cuja
competitividade é unicamente manter-se com vida outro segundo.
A forma existe para mostrar a
vida de um conteúdo, adapta-se porque interpreta o real e eterniza-se na
curiosidade humana que se senta na necessidade de reflexão.
O espírito marcial em pleno
século XXI não ecoa cortante no gume da katana, não se enumera em códigos Hagakures
ou se circunscreve a Livros dos Cinco Anéis. Sun Tsu, perdeu-se pervertido por
economistas, políticos ou vendedores. Resta-nos a sua essência, uma quietude funesta,
último ardil contra a voracidade deste tempo que nos obrigam a comprar.
O guerreiro do presente não é
um arquétipo do oriente, nem casta militar de ordem cavaleiresca no ocidente.
Em silêncio, por vezes no murmúrio
da escrita, não associa estoicismo ao renegar a queixa, honra a coragem dos
seus antepassados com as mãos mais que vazias, despojadas, pela violência feita
economia, casas frias pelo absurdo valor de qualquer energia, com as 24 horas
do dia transformadas em múltiplas ânsias que tem de acalmar, que tem de
pelejar.
Não há glória para o guerreiro
do século XXI, nem novelas cavaleirescas, nem ideais quixotescos. O peito
aberto não é heroísmo de estratega. É falta de roupa.
O romantismo do martírio não
tem sentido porque os esforços de guerra cavam sempre trincheiras de lama e as
ratazanas apenas trazem a doença de mais uma conta que saldar.
À noite, o merecido descanso
do guerreiro embala-se numa rede de desespero. Partilham-se filosofias virtuais
para que se mantenha da ideia o sonho. O espírito desnutrido sobrevive adormecido
por uma refeição diária mas conectada com o mundo.
Não há hara-kiri assistido. É normal
ver um guerreiro de joelhos. Há dignidade na humanidade em genuflexão ante a
sua própria condição, sempre que nos joelhos não pese humilhação.
Existe a tendência ao vazio.
A casta de ser-se guerreiro
revela-se na coragem com que alguns assumem a sua condição sem pudor, sem a
vergonha da violência deste presente em todo o mistério parece revelado por o
futuro contido neste novo século. Não há muita luz nem virtude nesta condição.
Existe realidade no vazio, mas
ainda há escassa liberdade de decidir se vale a pena levantar a guarda e lutar.
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