Falávamos do seu pai, recentemente falecido, quando me disse:
- O meu pai era um tipo duro connosco e com os funcionários do nosso negócio, mas era ainda mais honesto e justo. A sua presença foi uma forma de amor à qual nem sempre demos valor...
O seu olhar abandonou o vazio e fitou os meus a rir e continuou a recordar o velho ex-militar, cedo na reserva para cuidar os seus três filhos.
- Sabes, quando tinha dezasseis anos, numa discussão de adolescente, tive a brilhante ideia de o mandar foder-se. E ele, sem mudar de expressão, aproximou-se de mim e deu-me uma punhada na cara que ainda hoje a sinto.
Não havia amargura nas palavras daquele filho, já careca e com filhos mais velhos do que eu.
- Só me disse, se já falas como um homem, assume as consequências das tuas palavras como um homem.
Com o olhar perdido outra vez no vazio, quiçá perdido dentro de si mesmo, apenas rematou antes de mudarmos de assunto.
- Foi uma das lições mais importantes da minha vida. Era do caraças aquele homem. Ainda bem que o conheceste...
Pouco o conheci, para além de o ver sentado à porta do seu negócio, a apanhar ar com as mãos no cajado que me cumprimentavam, sem grandes sorrisos, mas cordiais.
O filho reflete o pai. E, hoje, já sei porquê sempre me senti bem naquele pequeno negócio de família cujo maior desconto sempre foi as histórias que me contaram.
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