Ainda sinto a tua voz. O timbre com que me chamavas para sentar-me ao teu lado.
Ainda se vê a racha do muro e o canil vazio cheio de sombras de tantos cães.
Ainda goteja o velho tanque da roupa, cheio de água da chuva que não foi ralo abaixo.
Ainda a contemplo a cuidar das flores enquanto lavas a cara na torneira fria.
Ainda sou eu quem anda às voltas no quintal e a perder soldadinhos na selva dos coentros.
Ainda somos nós, a roupa humilde estendida ao sol que espera poder servir a quem cresce atrás de nós, sem vergonha de velhice e desejosa por ser útil.
Ainda és tu o diminuto quintal que me possibilita apanhar ar nesta ausência das vossas vozes, confinado sem cão, com tanta roupa por lavar e sem ter um sítio decente para estender, sem flores para regar, nem canteiro para brincar.
A roupa é dum armário cheio e inútil, mas que por vós não acumula, não envergonha. Sabe de onde vem e porque é barata.
Posso sair para o vosso quintal na casa que nunca foi propriedade vossa. Escrevo isto recolhido, obrigado pelos tempos. Obrigado pelo presente.
O vosso, sempre foi o melhor... Nunca tive uma casa com quintal. Sou eu quem tem quintal.
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