terça-feira, maio 24, 2016

Texto para uns amigos (a quem, por casualidade, tive o privilégio de dar aulas)


Caríssimos amigos,

Quanto tempo já lá vai? Três anos? Caramba, o tempo passa a correr, parece que foi ontem que aí estávamos juntos e Valencia de Alcántara era paisagem comum a todos nós.

Não sei se estão de acordo comigo, mas a nossa perceção do tempo é assim, rápida, quase alucinante, um reflexo do mundo em que vivemos, da tecnologia que usamos nos bolsos, da rapidez com que nos frustramos se não somos capazes de acompanhar um ritmo que, quem sabe, até não é o nosso, mas algo imposto.

Apesar de ser um número curto, três (veloz, tipo de início de uma corrida “um, dois, três!”), se juntamos a este número o substantivo ano falamos de 365 dias a multiplicar por três, o que resulta em 1095 dias (dependendo se é bissexto ou não) e, vejam só o cúmulo do detalhe, 26 280 horas. Nem me atrevo a contar os minutos mas é óbvio que são muitíssimos!

Parece-me que tudo depende de como vejamos as coisas, mas, quase sempre, como dizia o T.S. Eliot, “a vida é longa”. Tudo depende da unidade de tempo, convencional ou não, com que a meçamos. Mais do que a medida dos segundos, horas, dias, anos, décadas, etc., gosto daquela medida quantificável para além do mostrador do relógio que aprecio como tempo de qualidade.

Não faço ideia quanto tempo estive convosco a exercer o papel do profissional que ensina verbos regulares e irregulares, pronomes reflexos, vocabulário e outras coisas relacionadas com a língua portuguesa, mas acho que, também, foram três anos cronológicos numa medida infinita de tempo de qualidade.

Ao receber o convite, para poder partilhar convosco um dia tão importante como o da vossa “graduação” académica, fiquei emocionado. Apesar de todos os alunos com que um professor se cruza serem parte do docente que é, não estava à espera. É com pesar que não estarei aí convosco e não vos aplaudirei “in loco” com esperança no futuro.

Fá-lo-ei aqui, de forma mais íntima, imerso num momento em que me sinto um pouco cansado, mas acompanhado pela vossa estima em ser digno da vossa recordação. Quero acreditar que não é porque ensino muito bem uma coisa que se pode decorar, como os verbos irregulares, mas sim, porque durante esses três anos que partilhámos houve uma coisa transversal ao ser humano, o respeito pela sua condição.

Não faço a mínima ideia do que vos espera o futuro. O mais comum nestes momentos é dizerem-se coisas “supermotivadoras” para que vocês sejam produtivos e se insiram bem na sociedade. Desculpem-me mas não sou capaz de vos dizer isso. A vida será o que sempre é: incontrolável. A única coisa que se pode controlar, e que nos une tanto à vida, é a atitude com que tentamos viver desde dentro e, talvez, cative qualquer coisa, ou alguém, fora de nós.

A mim, amigos, só me cabe agradecer-vos por se terem lembrado de mim, talvez num momento em que ando um pouco esquecido do que aprendi com o meu “Principezinho”, que todos somos príncipes mas “dignos das nossas circunstâncias”, e com o “Principezinho” do Saint-Exupéry, “que o essencial é invisível aos olhos”.

Vosso (Sempre)

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