Chego a Zamora, revejo a papelada para amanhã, e ponho-me a caminhar pelas ruas paralelas e perpendiculares ao local onde estou instalado. Gosto de andar assim, sozinho no meio do dia-a-dia de gente alheia ao meu quotidiano, a olhar para os recantos tão iguais e ao mesmo tempo tão diferentes da cidade onde vivo. O céu não enganava ninguém. Anunciava chuva e trovoada desde o início da tarde. Apanhou-me próximo dum edificio público à espera de ser inaugurado na companhia de duas simpáticas senhoras idosas que partilhavam um chapéu de chuva transparente. Ali nos abrigámos os três enquanto esperávamos que escampasse. É tão fácil meter conversa, ainda mais se o tempo está a jeito disso, e estas duas senhoras, uma aqui de Zamora, a outra saudosa da cidade condal, lembraram-me como "isto está difícil para os da minha geração e para os que aí vêm". Lembraram-me isto, com um estoicismo como que os seus anos vindouros não interessassem, não fossem importantes para este país, ainda por cima uma delas com um filho adulto a cargo e um neto menor.
Deixou de chover tão intensamente e despediram-se de mim com uma cordialidade castelhana diferente da do sul à que estou habituado. Uma delas disse-me: "Tenho de ir para casa porque deixei uma janela aberta!".
E lá foram, juntas, passos em comum, o mais digno deste país que vive dos seus votos mas que as esquece mal estes saem das urnas.
Decidi pôr-me à chuva de Julho para lavar-me do calor extremo do meu sul. Caminhei bastante em direção ao Douro e olhei-o de olhos encandeados a correr para Portugal. Na rádio, e nos ecrãs futebolísticos das esplanadas zamoranas, a seleção das quinas chega à final do europeu de futebol com um percurso repleto de mau futebol mas cheio de sorte pouco habitual, o que me faz pensar que sorte não protege só os audazes.
Um pouco antes da meia-noite, volto ao hotel, de onde vejo um parque infantil pouco apelativo à primeira infância, e deito-me com Claudio Rodríguez e a sua cidade na cabeceira.
Uma das senhoras disse-me que Zamora tem pouco para oferecer aos seus e aos de fora. Não quero acreditar. Espero que não tenha razão. Por ela e por este dia que finaliza aqui, única e simplesmente, porque Zamora existe.
quarta-feira, julho 06, 2016
Zamora. Passeio à chuva de Julho
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