“Para uma união ibérica de qualquer espécie, seja essa
espécie qual for, três cousas são essenciais, e sem elas nada se poderá fazer,
e antes de elas se fazerem é inútil pensar sem receio nosso em qualquer
aproximação. Essas três cousas são:
1º a abolição da monarquia em Espanha;
2º a separação final da península nas suas três
nacionalidades essenciais – a Catalunha, Castela e as províncias que conseguiu
submergir na sua personalidade, e o estado galaico-português.
É absolutamente impensável a solução do problema ibérico
sem ser por uma federação; é impensável a federação com a constituição
desigual, anti-natural, viciosa e falsa, dos estados ibéricos actuais.
(…)
De há tempos para cá se vem fazendo, por um processo de
combinação espontânea que vale muito mais, e significa muito mais, que qualquer
táctica de política amistosa, uma aproximação mental entre Portugal e Espanha.
Dir-se-ia que os dois países repararam por fim no facto aparentemente evidente
que uma fronteira, se separa, também une; e que, se duas nações vizinhas são
duas por serem duas, podem moralmente ser quasi uma por serem vizinhas. Esta
aproximação mental não implica, de parte a parte, a abdicação de cousa alguma
em que consista essencialmente a independência ou a personalidade de cada uma
das nações; duas criaturas podem ser amigos sem ser sócios. Implica tão-somente
um estabelecimento de entendimento e de amizade, natural no caso de Portugal e
Espanha, que nenhum conflito de ambições hoje separa, que uma civilização
tradicional comum aproxima, e que se encontram mais que nunca ante o problema,
comum também, de defender, naquela larga extensão da América, que por ambos foi
civilizada e aberta à continuidade do progresso, a tradição civilizacional
ibérica contra a incursão disruptiva de conceitos civilizacionais estranhos”.
Fernando Pessoa, in “Da Ibéria e do Iberismo”.
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