O Executivo, cansado de saber o que se passa, encena preocupação. E o Presidente da República nada adianta. Depois de tantos anos de inflacionamento dos preços, só quando estes começaram a aumentar a um ritmo semanal (e nem sei se entre a hora que escrevo e a hora que sai este jornal os combustíveis não estarão ainda mais caros), o ministro da Economia pediu à Autoridade da Concorrência (AdC) para investigar uma eventual cartelização. Como se o Governo fosse alheio à questão. Embora a Galp seja uma empresa participada pelo Estado e essa autoridade tenha o dever de investigar, sem precisar de «pedidos». Mesmo que todos os automobilistas já tenham verificado que as subidas são coordenadas nas diferentes gasolineiras. Ainda que o aumento do petróleo em dólares seja acompanhado pela desvalorização dessa moeda perante o euro.
A Galp detém o exclusivo da refinação em Portugal e controla mais de metade do mercado. Os seus preços são uma referência para as restantes petrolíferas. Nem sequer é necessário acordar aumentos. Mas o Estado, accionista da Galp, nada faz contra esta concentração. O Governo está mais interessado em proteger a empresa do que o consumidor. Já o Presidente da República elogiou o Governo por solicitar essa investigação (cujos resultados chegarão muitos aumentos depois). Ou seja, louvou-o por cumprir tardiamente a sua estrita obrigação, e mesmo que a AdC devesse apresentar iniciativa própria.
Claro que o presidente da Galp, com o maior desplante, diz-se vítima duma esmagadora carga fiscal. A direita portuguesa aplaude. Embora, neste primeiro trimestre de 2008, essa mesma empresa registasse um lucro de 109 milhões de euros.
Mas os impostos são justos, pois não incidem sobre os mais desfavorecidos e taxam um produto poluente. Mais. A razão dos elevados custos dos combustíveis não reside nos impostos e os preços não dependem somente do valor do crude. Existem outros custos, como os associados às transformações nas refinarias, nomeadamente os custos com salários. Ora, no nosso país, os salários são muito mais baixos quando comparados com a média na UE. Cerca de metade. O que deveria conduzir a um preço de venda ao público mais baixo do que nos demais países europeus. Contudo, o preço da gasolina sem chumbo 95, sem impostos, é mais alto em Portugal do que na maioria dos países da Europa, nomeadamente mais elevado do que na Irlanda, Espanha, Reino Unido, França, Bélgica, ou Alemanha. E só Itália e Grécia apresentam um preço de gasóleo, antes dos impostos, mais elevado do que em Portugal. Em todos os outros países é mais baixo.
Outros dados mostram que o aumento dos preços dos combustíveis não tem relação com as variações dos preços do petróleo na data em que foi adquirido (meses antes de ser vendido). Ou seja, as petrolíferas aumentam arbitrariamente o preço dos combustíveis e só faltava que os impostos baixassem para que pudessem lucrar ainda mais.
Entre a diminuição dos avultados lucros das petrolíferas e a descida dos impostos ? tão necessários num país que continua com graves desigualdades e acentuada desprotecção social ? é obviamente preferível a perda de lucros. Mas já que o Governo finge nada entender e nada poder e a Galp só pretende que Estado e consumidores abdiquem de rendimentos a seu favor, resta a justiça pelas próprias mãos. Isto é, terão que ser os próprios consumidores a defender os seus interesses. E chega de protestos. É necessário passar ao boicote. Já."
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