segunda-feira, abril 02, 2018

"Transparência" - Eugénio Lisboa

Morrer é só não ser visto,
é sair de ao pé de ti,
apagar-me em tudo isto,
deixar de ver o que vi.

Morrer é não estar em ti,
e mais do que não te ver,
é não ser visto por ti,
no deserto do não ser.

Morrer é como apagar-se
a chama que houve em nós,
é uma espécie de ficar-se
vazio da própria voz.

Vive o amor da atenção
que se tem por quem se ama.
Mas a morte atiça em vão
o fio que não dá chama.

Morrer é só não ser visto,
é passar a pertencer
a um livro de registo
que guarda o nosso não-ser.

(Eugénio Lisboa, Matéria Intensa, 1999)



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