domingo, outubro 20, 2019

Ser ouvido...

Ser ouvido, que me prestem atenção, que façam aquilo que solicito, eis o grande objectivo da minha atividade laboral. Há já muitos anos que sou consciente disso e são incontáveis as formações que frequentei (e até ministrei) para saber motivar, estimular, despertar no outro interesse por aprender. É algo transversal a várias profissões, porém, quando penso nisso, vem-me sempre à cabeça a de palhaço.
 
Para além de profissional, como pai, sinto o peso dessa obrigação. É onde, talvez, sinta mais frustração. Não quero que eles sejam desse tipo de pessoas que não fazem caso ao que se lhes diz, ao que se lhe explica com argumentos razoáveis e instruções simples de entender. Não tenho dúvida que a minha profissão me afecta como pai, que me subtrai paciência em certos momentos, e que me faz pensar em realidade mais além de qualquer tipo de pretensa vocação.

Fui educado a prestar atenção ao que me diziam, mesmo sendo eu um despistado. Fui educado nos valores de que havia de prestar atenção, fazer caso, aos mais velhos, quer para aprender, quer por uma questão de respeito. Não tenho nenhum trauma por isso, nem senti abusos de autoridade com os quais não soubesse lidar com o exemplo desses a quem ia prestando atenção. Actualmente, isto é algo estranho para muita gente.

Há pouco, os meus filhos, simplesmente, ignoraram os reiterados pedidos feitos por mim e pela sua mãe. O resultado afecta o resto da tarde e exige roupa seca que não temos à mão. Não sofro por vê-los cheios de lama e roupa rasgada. Sofro por ver como ignoraram tudo o que lhes pedi com argumentos perfeitamente inteligíveis e claros. Sofro por imaginá-los no magote da indiferença a quem os pode ensinar, a quem os pode ajudar a serem seres humanos um pouco mais evoluídos e menos neandertais. Sofro porque, por mais métodos e técnicas pedagógicas ao meu dispor, sei que tenho de ser eu o responsável por tudo, pelo seu "sucesso" e pelo meu "sucesso" como educador. 

Mao Tsé Tung era conhecido como «O Grande Educador» e não era nada democrático, nem sensível a argumentos lógicos para além de "livros vermelhos". Não posso estar de acordo com esta designação para o ditador chinês, mas não posso aceitar que se me exija tanto do que por vezes já duvido se sou capaz...

De quem é a culpa de me sentir assim? É minha. Se para o trabalho penso que era vocação, para a paternidade é obrigação. Sei que posso ser melhor pai, mas sou eu quem se tem ouvir a si mesmo...

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