sábado, setembro 12, 2020

Monólogos em Ping-Pong


- Ai, ando tão cansada...! Tenho tido imenso trabalho.

- Por acaso também me sinto muito cansada, estou mortinha que cheguem as férias.

- É, estou sempre a ser pressionada, é tanto que fazer... Eu, férias, nem vê-las.

- Eu preciso de gozar férias, se não nem funciono!

- Eu precisava era que não me fodessem a cabeça...

- Por acaso não me posso queixar disso, as pessoas com quem trabalho são impecáveis.

- Pois, mas às vezes não são as pessoas do trabalho as piores.

- Sim, mas em casa também não posso dizer que tenha problemas.

- O meu marido, por exemplo, não faz nada em casa, os miúdos deixam tudo em todo o lado e a criada que arrume. Ainda ontem me zanguei com eles.

- Ah, o meu ajuda-me muito. E os meus filhos, que remédio!, também arrumam as coisas deles.

- Os meus se puderem não fazer nada...

- Os meus fazem, mas tenho que puxar por eles.

- Depois o pai às vezes é outro filho.

- O seu não faz mesmo nada em casa?

- Não, nada.

- Ai, o meu - é como digo - ajuda-me muito. Ainda ontem lhe disse que estava cheia de dores nas pernas, pedi para ser ele a ir pôr o lixo lá fora e ele foi. Lá disso não me posso queixar.

- Se eu não fizer as coisas, a casa bem fica um descalabro.

- A minha não.

- A minha fica. Ninguém me ajuda.

- A mim ajudam.

- A mim não.


Publicado no blogue Grão de milho (25-11-2017), que já não existe.



Sem comentários: