De meu pai, Hipólito, apercebo-me da linhagem de Teseu, esse "homem forte por excelência", e nem o intuia. A sua discrição nunca mo permitiu descobrir no seio da nossa casa, onde cresci num labirinto em que o novelo da lealdade não me deixava sucumbir à superstição do minotauro ou à minha natureza obstinada e bovina.
Hoje, por entre mitologias que não aprendi da minha família, descubro no homem que me criou um passado não transmitido pela palavra, um legado a fluir-me pelas veias e nas veias dos meus filhos, ainda mais peninsulares que eu. A Ibéria é a nossa fortaleza, o reducto mais ocidental da nossa matriz, a nossa avó Europa, a quem sempre chamámos Helena, desconhecendo as nossas origens em Tróia.
Portanto, a ventura deste dia chega tardia, contudo chega a tempo de ser reconhecida. Teseu era um camponês armado guerreiro, cuja cumplicidade com os deuses, apesar do seu cepticismo, marcou a nossa condição de homem e de seres em busca de infinito.
Penso no meu pai, penso nas suas raízes, na relação atribulada com o seu pai. Descubro no seu nome, na estranheza com que me soava quando o pronunciava em criança, e, tantos anos depois, tudo tem sentido. Sou filho de Hipólito, "libertador dos cavalos", neto de Teseu e de Hipólita, a rainha das amazonas. Sou o passado que pude conhecer, que pude entender. Sou a pouca memória familiar afectada pela mitologia e espero que os meus filhos saibam os nossos nomes. Só assim entenderão os seus.
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