Tirar pedras do caminho, neste caso das entrelinhas por onde o tractor corta mato para limpar o terreno e libertar as árvores para crescerem mais à vontade, foi a minha tarefa de hoje. No léxico do campo, das preparações de terrenos agrícolas, a isso chama-se a despedrega, logo o verbo deve ser despedregar.
Auxiliei como pude, e da melhor maneira possível, o trabalho do John Deere, que, a somar horas, rodava pela terra colonizada de pasto tardio a ocultar pedras potencialmente perigosas para o brio do seu roçar.
Enquanto ia à sua frente, a agaixar-me contantemente para agarrar em pedras inconvenientes, a juntar várias em pequenas piçarras ao longo da linha, não pude deixar de pensar que isto de despedregar o caminho de alguém não tem porque ser um acto de facilitar a vida ao outro, dar-lhe o peixe e não o ensinar a pescar. Tirar as pedras do caminho, ou alertar para a sua presença, é também um acto de responsabilidade da nossa parte, um dever por vezes, pois basta uma pedra escondida para estragar toda uma engrenagem que antes funcionava na perfeição.
Pensei nas minhas costas, na minha genética herniada desde nascença e se alguém se aperceberia do meu esforço (mentalmente convertido em preparação física). Também pensei nos meus filhos. Não sou um exemplo de tirar demasiadas pedras do seu caminho, sou mais de alertar e de os ensinar a prestarem atenção aos passos que dão e, se tropeçarem e cairem, aprenderem a levantar-se. Esse é o resultado da queda.
Despedregar a vida, ao contrário do campo, é impossível. No campo, entre maquinaria, trabalho braçal e, no pior dos casos, explosivos, não há pedra que resista. Porém a vida não admite nenhuma destas soluções e dá-te a certeza da pedra, educando, desde bem cedo, as almas sensíveis às texturas dos rochedos. Perante tal impossibilidade de despedrega, esculpe-se o momento ou, como há algum tempo aqui escrevi, aprecia-se a beleza da pedra, o que os japoneses chamam «Suiseki».
Não pude fazer tal coisa. Nestas pedras o «Suiseki» não é evidente, nem espampanante, era apenas uma questão de prática paisajística para a qual não tenho disponibilidade.
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