quarta-feira, fevereiro 14, 2018

"E, todavia, eu não quisera amar-te..." (Jorge de Sena)


Janine Niepce, Nu juvenile, Paris, 1958


E, todavia, eu não quisera amar-te.
Mas ter-te, sim, de todas as maneiras.
Quem és e como és, de quem te abeiras,
que dizes ou não dizes, pouco importa.

E muito menos hoje me conforta.
Neste sorriso que te dou tranquilo,
eu ponho num remorso tudo aquilo
que em fundo amor eu pudera dar-te,

se alguma vez te amasse de amor fundo.
Senta-te à luz do mar, à luz do mundo,
como na vez primeira em que te vi,

tão jovem, que era crime contemplar-te.
E despe-te outra vez, pois vêm olhar-te
quantos te buscam de saber-te aqui.

Sendo um de tantos, nunca te perdi.


Jorge de Sena

Soneto VI de "Sete sonetos da visão perpétua", in Peregrinatio ad Loca Infecta (1969)




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