Uma boa história pode ser tão má que fico a adorá-la. Um mau actor pode ser tão canastrão que me fica no coração. Porque é que a arte tem de ser só sublime? Não há arte pateta? Quanto mais estudo arte, mais dúvidas tenho em defini-la, catalogá-la, ainda menos hierarquizá-la.
Nos últimos dias, tenho feito a digestão do jantar tarde. Eu, que não sou de me deitar demasiado tarde, tenho ido para a cama depois da uma e com um ou dois filmes vistos. Para o critério cinéfilo só tenho visto série b, talvez mesmo z, ou, simplesmente, merda. Mas para um escatológico o dejecto é resultado da vida. Só caga quem está vivo e nestes últimos serões as interpretações foram o menos importante, as histórias agradavelmente previsíveis, mas a porradaria épica!
Ainda hoje estava a divagar sobre o tanto que aprendi graças a ter sido um fã do Bruce Lee, de como, para além de Wing Chun ou métodos de Jet Kune Do, fiquei curioso com filosofia oriental e com a sua própria filosofia. Lee era mais que um pontapé rápido, era um mestre de aforismos cuja figura ganhou a imortalidade porque a sua vida merece a pena ser recordada.
O Sylvester Stallone também está no rol. O Rocky é indissociável do «Italian Stalion» que começou pelo porno e se manteve erecto no meio duma indústria que já não necessita dos anabolizantes de outrora, mas que continua sem perceber que o Rambo é muito mais do que o soldado do regime Reagan.
O regime Trump terá um canastrão como o Reagan teve nos 80? É capaz, mas o género já não vinga. Talvez qualquer coisa rápida e com carros furiosos de vários milhões de dólares possa evadir as mentes dos novos cinéfilos de coca-cola e pipocas no centro comercial e em streaming.
Não sendo velha escola (totalmente), ainda vejo DVDs e vou gravando filmes na box. Streaming nunca me habituei e as internets caseiras também não ajudavam...
Tudo isto para dizer que vi uns quantos filmes maus com a felicidade de os ter visto numa tarde de Verão escaldante em que não tinha para onde ir, tal qual como quando era miúdo.
Mas a idade pesa. Já não quero ser tão bom à porrada como o Van Damme e tenho um olho apurado para o verossímil. Gosto de boas coreografias de luta mas com fundos de realidade e menos espectacularidade. O efeito «Matrix» já é estilo clássico e o MMA não é só grappling, o «pound to pound» devolveu a espectacularidade de combinações e rotativos dignas dum hipster de 70 anos chamado Chuck Norris.
No entanto, para voltar à essência do que me fez escrever esta entrada no diário, foi no filme «Undisputed III», com o Scott Adkins, em que a poesia não abandona os filmes fáceis e previsíveis com a personagem do colombiano dopado, protegido pelos vilões acima dos vilões (os vilões ao quadrado digamos), a ler a poesia de Federico García Lorca à sobra do chapéu de sol, enquanto os adversários trabalham (mas convertem-no num treino) num campo de trabalhos forçados.
Dois mundos estes. O da dureza da força da picareta e o da subtileza da poesia...
quinta-feira, junho 22, 2017
O vilão que lia García Lorca
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