A malta, que gosta de escrever, pergunta, e pergunta-se, como é que se aprende a escrever. As letras básicas, primárias, na escola. Os argumentos e contratos de sobrevivência na maioridade, em aulas de primeiros socorros em caso de letra pequena. Aprendida a ordem alfabética da lista de compras e posta a máquina de lavar a trabalhar com uma leitura correcta das etiquetas, os amantes da escrita perdem o medo de debotar a roupa e iniciam-se nesse mundo fantástico de misturar peças brancas com outras de cor.
Assumida a tendência de mistura, volta-se às origens, aos detergentes clássicos, como o sabão azul, nada agressivos e aromáticos, lê-se o que se escreve a frio e aceita-se a má qualidade do quente, entre sorrisos orgulhos e vergonhosos, e sempre se tem à mão o efeito branqueador da lexívia.
Quem fez e faz muitas tarefas domésticas conhece os clássicos como Ismael conhecia o convés do Pequod.
Mas há sempre quem te queira vender um robô de aspiração, de cozinha, e inscrever-te em workshops criativas que, com truques e pistas de nóbeis, facilitam o fluir de palavras em obras para a posteridade. Tudo é legítimo na lida da casa como na literatura. É uma questão de possibilidades e, para quem pode, de escolhas. Houve tempos que não tive possibilidades, hoje posso e escolho a labuta sem atalhos que não estejam à minha mão, cheia de sabão macaco.
Porém, a escrever aprende-se depois de ler. Ler tudo o que seja primário, primeiros socorros, contratos e garantias de que o que se lê constrói o abrigo com provisões para os invernos, ou infernos, de escrita.
Escrever é como tudo na vida. É como a lida diária que vos descrevi, ou, caso tenha empregada doméstica, andar à porrada. Todos sabemos dar um murro e pontapés e ir para a rua andar à batatada. Aprende-se empiricamente. Ou optar por treinar com quem sabe, olhar para o seu exemplo, e evitar uns quantos olhos à belenenses...
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